_O CLÃ MITIDIERO ------- RESUMO BIOGRÁFICO

__Nos últimos dias de vida, o velho Heli Gonçalves Mitidiero reviveu em pensamentos todos os momentos de sua vida. Nostálgico lembrou-se de seu pai José Gonçalves, lavrador rude mas de boa índole que o criara com pulso forte e rédeas curtas.
*O velho Heli Gonçalves Mitidiero . Foto Joel Di Oliveira / 2014.
Através de uma névoa esbranquiçada vislumbrava imagens de Ceppa Mitidiero, sua mãe; mulher de pele clara e olhos castanhos, filha de imigrantes italianos. Certamente herdara dela essas características, mas de seu pai, a teimosia e uma ferrenha vontade de trabalhar. Disfarçadamente deixou brotar uma tímida lágrima, falar de Ponte Alta onde nascera o fazia voltar aos tempos de quando era apenas um meninote no colo de seu avós Antonio Mitidieri e Domingas Bianchi. Atentamente o escutei contar seus causos, e confesso-lhes:
Poderia escrever sobre ele um livro inteiro, mas vou ater-me a citar apenas alguns fatos interessantes e surpreendentes que ele me confessou.

O Sr Heli e sua esposa D. Maria Josina ( Foto gentilmente cedida por Ana Paula Mendonça).
Durante sessenta e um anos participou da Congregação Cristã no Brasil, e desses, cinquenta e um, foi como integrante do ministério. Práticamente desde que construíram o templo situado na rua Jataí, número 750, no Bairro Operário em Uberlândia, Minas Gerais. Foi um cristão de imensa fé, sempre em nossas conversas ele citou o nome de Deus.
Casou-se com Maria Josina, cabocla morena lá das bandas de Tiros em Minas Gerais, e pela Graça de Deus, geraram dez filhos, sendo: João, Daniel, Marta, Léia, Heli, Elias e Eliu. Não cito aqui o nome de dois filhos homens e uma mulher, pois Deus teve para eles projetos diferentes em seu reino.

*Templo onde o senhor Heli congregou com os irmãos de fé durante sessenta e um anos.
 Foto: ccbhinos.com.br
Em prosa contou-me das peripécias que passara antes de vir se fixar em Uberlândia. Seu sonho era adquirir terras e criar gado leiteiro, eu o entendia perfeitamente, pois grande parte dos homens de sua geração mantinham esse ideal. Recordou-se de Piu Pereira, grande fazendeiro do distrito de Cruzeiro dos Peixotos, ali, aos dezessete anos de idade trabalhou nos imensos campos de arroz. Lembrou-se de quando levava boiadas de Martinesia até Goiás; era segundo ele, uma vida duríssima. Toda a viagem era feita em lombo de cavalos e muitas vêzes, as refeições eram basicamente broas de fubá. As estradas eram de chão batido e os rios não tinham pontes, se quisessem atravessar, tinham que esporear os animais na correnteza forte.


*Sorridente disse que as lavouras eram 
infestadas de cascavéis. 
__Sorridente disse que as lavouras eram infestadas de cascavéis e que numa braçada ou outra sempre vinha alguma enrrolada pronta para o bote, inúmeras vêzes jogava o feixe para um lado e matava o bicho. Comentei com ele se não conhecera meu pai, pois ele também nessa época, juntamente com mais dois companheiros tomava o trem de ferro em Bambui e vinham para essas frentes de trabalho aqui no Cruzeiro ou mesmo na Martinésia. Eram longas viagens de trem e quando aqui chegavam se hospedavam de um dia para o outro na "Pensão do Japonês" que ficava em frente a estação, hoje no local construíram o Fórum de Uberlândia. Notei sastisfeito que essas lembranças lhe faziam bem e com novas perguntas lhe pedi que me contasse mais de sua vida. Falou-me que trabalhou por um bom tempo em Capinópolis plantando arroz para os Barroso, salientou que foram tempos difíceis mas que com a ajuda de Deus vencera. Esteve no município de Uberaba por um bom tempo, mas logo decidiu vir para Uberlandia onde instalou a primeira draga de areia e cascalho. Depois montou uma frente de trabalho na fábrica da Cargill, essa multinacional inaugurou sua unidade para processamento de soja e milho em 12 de março de 1986, e ele, Heli Gonçalves Mitidiero, honrosamente faria parte dessa história.  


HG NA HISTÓRIA DA GIGANTE CARGILL

    
Heli G. Mitidiero Filho, gerente  da
 Disk-Kçamba.
__Juntamente com os filhos Heli, Elias e Daniel fundou a firma HG, responsável pela limpeza do site e da retirada dos resíduos da fábrica. Os Mitidieros, eram para se dizer, páus para toda obra dentro da unidade. No início, antes da automação da indústria, chegava-se a encher caçambas á base de pá, pois ainda não se implantara o sistema com poliguinchos. Esse sistema só veio a ser utilizado alguns anos depois quando seu outro filho deixou o emprego no ARCOM (Armazem do Comercio). Esse, batizado com o mesmo nome do pai, gerenciaria a partir de 1989, a Disk-Kçamba. Era o fim da HG, com esse evento, o velho Heli se retiraria para viver o seu tão almejado sonho. Com valores que amealharam com os serviços da HG, os Mitidieros adquiriram as terras que o velho sempre sonhou, e ali, até que ficasse pronta a sede, se abrigaram em barracas construídas com lonas. Foram tempos de muito trabalho, gabirú(Elias) conta que o velho era enrrustido nas empreitadas, quantas vêzes o surpreendera carregando nos ombros os mourões para o feitio das cercas.

                                                                       UM SONHO REALIZADO  
 
Elias G. Mitidiero (Gabirú)
 __A partir de 1991, o senhor Heli se dedicou a cuidar de sua propriedade, encheu o pasto da fazenda com gado leiteiro, arborizou o quintal com árvores frutíferas de várias espécies e toda semente ou muda que jogasse na terra logo crescia e produzia. E nas tardes, após o trabalho chegava a varanda, enchia os pulmões com ar fresco e se sentia realizado. Assim viveu bons anos de sua vida ao lado da esposa e de seus filhos.  

Mas o tempo é como o vento, com o fim da HG e o velho Eli já enfraquecido para o trabalho diário da fazenda, os filhos Daniel e Elias se retiraram dos serviços da Cargill. Os dois, como sócios acionistas teriam cada um suas funçôes na nova Disk-Kçamba. Mas Gabirú não abandonou o trabalho na fazenda.

Daniel G. Mitidiero (Carlos).

__Daniel ou Carlos, como muitos o chamam, além da manutenção das caçambas. seria responsável pela cozinha, que por sinal, se fazia afamada desde os tempos da HG.
Mas o sonho para o velho Mitidiero começava a se desvanecer, depois de perder a esposa com quem viveu sessenta e três anos, o homem já não era o mesmo. Eu, observador que sou,  o vi caminhando pelas estradas da fazenda como se procurasse algo, talvêz sim, um caminho que o levasse de volta para onde tudo começara em sua juventude. Quantas vêzes o vi fitando o infinito, certamente tentava vislumbrar, com as fracas vistas que já tinha, a imagem de sua companheira Josina.


...talvêz tentando vislumbrar com as fracas vistas que já tinha, a imagem de sua amada Josina. 
O ÚLTIMO DIA

__"Vinte e quatro dias" depois, mais uma vêz almoçamos todos juntos. Ele comeu bem, e como sobremesa saboreamos uma suculenta melancia que ele trouxera da cidade. Gabirú conta que quando ele foi pagar a melancia, o velho tirou do bolso um maço de dois mil reais e lhe entregou dizendo que era para ele ficar pois "não ia mais precisar". Sem dar importância ao verdadeiro sentido daquelas proféticas palavras Gabirú guardou o dinheiro. Carlos, relembrou que mais cedo ele comentara também que "aquele dia era o mais triste de sua vida", mas qual Gabirú, a ficha não lhe caíra também. O velho provavelmente sabia desde o amanhecer que aquele seria seu último dia entre nós.

                             
                               O REPOUSO DO GUERREIRO
A filha Marta G. Mitidiero, 
não compreendia a aflição que
estava sentindo...

 __Á noite, como num cerimonial, ele se preparou para ir ao culto, acessorado pela filha Marta, que por sua vêz, começara a estranhar os estranhos trejeitos do pai. Ela não entendia o que estava acontecendo, não soube responder a filha Vitoria que sentira também a aflição da mãe. Seu coração parecia apertado como que prenunciando algo terrível que pudesse acontecer, certamente eram as forças supremas preparando-a para o momento crucial. Naqueles instigantes instantes, se algo acontecia era no íntimo do velho Heli, ele provavelmente saberia responder a pergunta da neta Vitória. Mas como um guerreiro que retorna de truculentas batalhas, banhou-se calmamente, vestiu seu melhor terno e saiu. Na igreja caminhou lentamente cumprimentando todos, e diante do altar quando terminava sua oração, tombou ao chão. Levado ás pressas ao pronto socorro, já não se pôde fazer mais nada. O velho Heli Gonçalves Mitidiero morreu processando a sua inabalável fé, e assim, como um pássaro, ele voôu para a eternidade, certamente sem dor alguma.

Heli Gonçalves Mitidiero-1928 + 2014
__Ele viveu a vida como pôde, conseguiu com seu trabalho realizar sonhos. Agradecido, confessou a esse que vos escreve, que Deus lhe fora de uma bondade imensa, pois amigos de sua geração já haviam todos falecidos, e ele ainda estava aqui pelas graças de Deus. Naqueles dias eu meditei profundamente aquelas citações, e confesso, cheguei as vezes pensar no pior. Hoje eu lamento não tê-lo conhecido há mais tempo, pois certamente  teria muitas histórias para me contar.


                                  PEIXE GRANDE NA REDE

João Gonçalves Mitidiero
__Assim como João, o filho mais velho que me contou uma passagem interessante e um tanto engraçada. Ele e o pai haviam deixado uma vara de anzol em espera num rio próximo de onde moravam, pois precisavam conseguir carne para as refeições. No dia seguinte, certos de que conseguiriam um bom pescado, voltaram ao local. Chegando lá notaram que a linha estava demasiadamente esticada. Olharam um para o outro e pensaram felizes ter um peixe grande ali. Atento, para um moleque de sua idade, João viu quando seu pai apanhou a linha e puxou. Melhor nem tivesse feito isso, lá de dentro do rio surgiu um jacaré de quase dois metros se debatendo como um louco para escapar do anzol. Rabada daqui, rabada dali, mas como escapar?! O velho Heli nessa época era forte como um touro, e na base do muque, tentou trazer o bicho a flor dágua. Foi um Deus nos acuda durante longos minutos. A margem do rio virou um piseiro; não poderiam de maneira nenhuma deixar o bicho escapar, pois, segundo João, era carne prá mais de mês. João conta que já estava com água na boca pensando nos tenros nacos de carne, quando a linha arrebentou. Ficaram os dois vendo o bicho sumir nas águas profundas do rio. É verdade, não é história de pescador, naquela época, era uma questão de sobrevivência, e hoje, se recordando desses fatos, ele ri. É sua maneira de manter dentro do coração, a memória viva de seu pai.

__Bem como  a filha Léia e o caçula Eliu, que certamente tem lembranças esquecidas num canto de suas mentes, mas que agora aflorarão com intensidade no âmbito de seus seres.
Eliu e Leia Gonçalves Mitidiero
__A morte é apenas o fim da carne, o espírito eleva-se á dimensões superiores e nunca morre, mesmo porque, nós que ficamos na vida terrena, não nos desapegamos deles e nem desejamos nos esquecermos deles. Já faz doze anos que perdi a minha mãe e ainda hoje a vejo em pensamentos em todos os momentos. Vejo claramente seu sorriso, a suavidade de sua pele e a bondade de suas palavras de mãe, e isso eu não quero jamais deixar de lembrar. O senhor Heli estará vivo em cada um de nós, e certamente seu espírito foi recebido num plano maior. E se fecharmos bem os olhos, poderemos vê-lo se afastando feliz com aquele sorriso que conhecemos.

Figuras alusivas à Heli Gonçalves Mitidiero e D. Maria Josina(Desenho: Joel Di Oliveira).
  __Cabe agora, aos filhos, netos, e a linhagem vindoura honrarem-lhe o nome, as lembranças e os ensinamentos deixados por ele. A união das famílias baseadas no Sagrado Livro de Deus sempre levará  á bens maiores.
Então, que jamais se disperse, em situação alguma, o Clâ Mitidiero.

OBS: Escrito e ilustrado por Joel Di Oliveira administrador de Enigmacom (Histórias que o povo conta). Proibido cópias e ou reprodução sem prévio consentimento do site. Todos os direitos reservados.
O Texto e as imagens desse documento foram publicados sob autorização dos filhos Eli, Daniel, Elias, João, Eliu, léia e Marta Gonçalves Mitidiero. Os fatos narrados me foram confidenciados pelos filhos e o  próprio Heli Gonçalves Mitidiero.  O nome Mitidieri é italiano, mas no Brasil abrasileirou-se para Mitidiero. CLÂ SIGNIFICA AGRUPAMENTO DE FAMÍLIAS VINDAS DE UMA MESMA LINHAGEM.

                 


Comentários

  1. Deus o abençõe pela honra que deste ao meu avô por esse lindo documentário!

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    1. No pouco tempo que convivi com ele, passei a entender mais ainda a complexidade de nossa existencia, e aí, CherryDeb, somente temos a aprender!

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  2. nao podemos esquecer tambem,sua FE, a luta pela obra de DEUS,e tudo que passou para seguir a doutrina que escolheu...

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  3. como faço pra mandar a foto da lea e do Elio

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    1. Pode mandar por email, que è:
      joeldioliveira@gmail.com

      Desde já agradeço sua ajuda, estava precisando mesmo dessas fotos. Obrigado e aguardo. Se, por acaso tiver a foto de D. Maria Josina me mande tambem!

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  4. O nome do outro filho é Eliu e não Liu.

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    1. CherryDeb! Mais uma vêz me ajudando. Fico feliz, obrigado! Fique á vontade para me ajudar nos detalhes...

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  5. Obrigada por retratar um pouco da história de uma pessoa que foi por nós tão amada! E meu nome é Vitória, não Flávia! Mas um vez obrigada.

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  6. Homem de fé e bondade. Exemplo a ser seguido. Linda homenagem!

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  7. Tive oportunidade de conhecer e conviver um pouco com Sr Heli, e realmente foi uma grande pessoa e tenho uma enorme admiração por ele!!!! Linda homenagem!!!! Parabéns

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