CORREDORES SOMBRIOS



A vida na terra é um milagre para todo ser vivo que nela habita. Com a agitação em que vivemos nos dias de hoje fica difícil dizer que estamos a todo momento seguros, pois basta um segundo de distração ao atravessarmos um cruzamento ou rua que estaremos sujeitos a fazer a travessia para uma outra dimensão. E quando o fazemos nesses termos deixamos de cumprir na terra algo que nos foi designado quando nascemos. Somos seres em desenvolvimento ao propósito de um Ser Supremo; a morte nos leva a um outro plano no qual aprenderemos novas formas de comportamento, e tudo isso, acredite, nos levará um dia á nos sentarmos ao lado do grande mestre criador. O prezado leitor poderá dizer que são belas palavras para esse texto, mas transcrevo-as porque li muito a respeito. Sou simplesmente um vigilante noturno da Escola de Medicina da UFU, mas isso não quer dizer que tenho que ser cego as centenas de obras sobre vários assuntos interessantes que existem expostos nas livrarias. E entre as rondas que faço várias vezes pelos longos e sombrios corredores procuro ler algo para ajudar a passar o tempo. É um tédio atravessar uma noite inteira ali naquele posto, mas hoje quero relatar um estranho fato que me aconteceu numa dessas rondas, e garanto, aquela noite nada teve de entediante.

Era por volta de duas horas da madrugada quando saí para a ronda, tudo estava muito quieto, em outras situações costumava encontrar pelos corredores algum dos enfermeiros que por ordem médica levava algum medicamento a algum internado, mas naquela noite estranhamente não encontrei ninguem. Vesti o casaco pois estava muito frio e tomei o corredor em direção ao setor de enfermarias, pela vidraça vi que todos os doentes dormiam, sossegadamente não posso dizer, mas não tinha ninguem acordado naquela hora. Adiantei-me e peguei outro corredor do lado norte, ali, naquele local algo muito estranho me aconteceu. O fato me lembrou tempos depois daquele filme em que uma meninha aparece fitando estranhamente aquela personagem do filme. Mas ali, naqueles instantes não era um filme, estava realmente acontecendo. Ao longo do corredor tinha uma escada em curva que levava aos banheiros no andar de cima, e ao passar vi uma menininha sentada nos degraus, achei estranho, naquela hora uma criança sozinha naquele lugar!?
Chamei por ela por duas vezes e ela continuou calada com a cabeça abaixada, e quando fiz menção de ir em sua direção ela correu para os banheiros. Subi a escada chamando por ela e adentrei aos mictórios abrindo cada porta sem a encontrar. Por fim, vi a porta do ultimo balançando, ela certamente havia se escondido ali. Abri a porta e para minha surpresa ela havia desaparecido, como eu não sei, pois para sair dali a menina tinha de ter passado por mim. Com um arrepio compreendi naquele momento que eu estava diante de uma aparição. Abandonei correndo o local e voltei ao meu posto quase sem fôlego. Para falar a verdade naquele resto de noite não fui capaz de fazer mais rondas, e até hoje não passo mais por aquele local. Que meu chefe não saiba, mas por mim aquele setor ficará sem ronda até quando eu me aposentar.A menininha que eu vi naquela noite certamente morreu de alguma doença que não foi suficientemente tratada em tempo, e portanto desencarnou antes de seguir seu destino nessa dimensão. Assim, perdida entre os dois mundos procura naqueles frios corredores pela mãe ou algum ente querido, pois foi ali, o seu último contato na terra.

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